No dia em que foi noticiado o recuo no novo aeroporto de Lisboa, uma notícia no New York Times atualizava dados transmitidos pela sonda Perseverance, a partir de Marte. Um retrocesso em Portugal leva sensivelmente o mesmo tempo que planear a chegada a um novo planeta… a pé.
Onde é que isto nos conduz? Ao caminho da regionalização. Mas esse caminho é uma discussão que se arrasta há quase 50 anos. Nesse intervalo de tempo, o homem chegou à lua, a ditadura foi-se, a Europa uniu-se, o muro de Berlim caiu, a URSS dividiu-se, Timor libertou-se, os bancos faliram, Sadam foi derrubado, o terrorismo cercou-nos, a Troika chegou, a Troika partiu, e um vírus confinou-nos. E nós continuamos entretidos na dormência da discussão.
Há que ache que isto custará mais dinheiro. Mas eu acho que a questão que se coloca não é quanto se vai gastar a mais com as regiões, mas quanto estamos a gastar a mais por não as termos.

VEJA AQUI O ARTIGO DE OPINIÃO COMPLETO:
“
Só um saltinho
No dia em que foi noticiado o recuo no novo aeroporto de Lisboa, uma notícia no New York Times atualizava dados transmitidos pela sonda Perseverance, a partir de Marte. Um retrocesso em Portugal leva sensivelmente o mesmo tempo que planear a chegada a um novo planeta. O Aeroporto Internacional do Centro, que deveria ser solução a ponderar, fica demasiado longe para quem é de Lisboa. Caricato é que, para a localização se manter junto a Lisboa, há quem advogue que essa mesma distância se tornará suficientemente perto para a Região Centro. “Só um saltinho”, dizem.
Olhando para o nosso território, apercebemo-nos de que temos uma especial apetência para chover no molhado, para atrair investimento onde já existe investimento, ao invés de atrair investimento para onde não existe.
Vejamos o caso do turismo. As estadas na Região Centro cifram-se no baixíssimo número de 1,6 dormidas por hóspede. Ao passo que a estada média no País tem variado, nos últimos cinco anos, entre os 2,4 e os 2,8. Por que é isto importante? Porque o aumento da estada média dos hóspedes numa região como a nossa é um fator decisivo em termos económicos. Um aeroporto fará toda a diferença na captação de turistas.
Onde é que isto nos leva? Ao caminho da regionalização. Mas esse caminho, uma vez mais, é uma discussão que se arrasta há quase 50 anos. Nesse intervalo de tempo, o homem chegou à lua, a ditadura foi-se, a europa uniu-se, o muro de Berlim caiu, a URSS dividiu-se, Timor libertou-se, os bancos faliram, Sadam foi derrubado, o terrorismo cercou-nos, a Troika chegou, a Troika partiu, e um vírus confinou-nos. E nós continuamos entretidos na dormência da discussão.
Há quem diga que Portugal é pequeno de mais para ter regiões, e que ele próprio é uma região. Contudo, a Dinamarca tem cerca de metade da nossa população e dá-se muito bem com o modelo. Curiosamente, há quem desvalorize a Dinamarca, porque os tipos só querem saber de educação, e turismo, e cultura, e combate à corrupção, e outras banalidades em que somos exímios a discutir. Por vezes discutimos tanto, mas tanto-tanto, que nos tornamos ingovernáveis.
Quanto à regionalização, na Região Centro ela só faz sentido se tivermos no topo das prioridades o interior do País. Temos desperdiçado essa porta de ligação a Espanha e à Europa, esse mercado que deixa de ser de dez milhões de habitantes para passar a muitos mais. O interior é fundamental para o desenvolvimento. Tem particularidades únicas. Tem um potencial turístico e económico que carece de ser mais bem aproveitado. Talvez quando deixarmos de vogar no Tejo percebamos que há outros rios que correm entre os sulcos do país real.
Cerca de 45% do total da população portuguesa reside nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Constrói-se estradas, vias, mais pontes, mais betão. E uma década depois constrói-se mais e mais e mais. Uma bola de neve que se alimenta a si própria.
A proximidade da política com as populações locais e regionais ajudaria restaurar o diálogo com os cidadãos. A proximidade é, sem dúvida, um bem que não podemos desperdiçar. A escala regional permitirá um trabalho em rede, criando instrumentos de coesão, fortalecendo os territórios, respondendo melhor aos desafios da governação, aumentando a eficiência, melhorando os serviços prestados e reforçando a democracia.
Há que ache que isto custará mais dinheiro. Mas eu acho que a questão que se coloca não é quanto se vai gastar a mais com as regiões, mas quanto estamos a gastar a mais por não as termos.”
in diário As Beiras, 19 de março de 2021